domingo, 30 de dezembro de 2012

Yellow men




Feliz é o poeta
Que falou do homem amarelo
O amarelo pelo
O amarelo pele
Os pólos amarelos

Feliz é o poeta
Que enxergou o homem amarelo
O amarelo gostoso
O amarelo dengoso
Os tropos amarelos

Feliz é o poeta
Que falou com o homem amarelo
O amarelo sedutor
O toque amarelo
O seu falar
Feliz é o poeta
Que transou com o homem amarelo
O maravilhoso amarelo das minhas visões

Pentecostes


Seu corpo belo
Escultural
Com a voz rouca
Nos beijos a mais
Que vontade tocar
Os lábior brutos
Com braços singelos
Ou o contrário
Que me deixa louco
Como um Deus exibido
No templo nu
Corpo do espírito
Gostos medianos
Com peles no templo nu
Paladares a cada parte do corpo
Em ti
Sexo
Just do it

Pai e filho


Te vi, bebê no colo, uma pena ver o quão feliz está. Não que eu queria vê-lo infeliz, apenas lamento seu bebê, que tem mãe. Fico infeliz ao ver tal beleza reproduzida numa criança que não será minha nunca. Nem ao menos pelo pai. Como Jesus. Filho e pai ao mesmo tempo. Seu olhar para mim é um encanto magnífico, me surpreende de forma a glorificar meus dias. Desejo-te, quero-te, único em mim como a reprodução do meu reflexo, espelho da alma, luz dos meus dias. Me deixas bonito. Só por viver. Tu que carregas no colo a prole. Que vive a alma de duas pessoas num único coração. Desejo-te, em carne, sangue e amor.

sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

Podre



Ontem eu morri, por dentro. Morri de agonia, de tristeza. Não ria da minha solidão. Não é piada. Ontem eu morri de amor, pelo que não tenho. Assim, sofri. Eu não tinha amor. Hoje eu quero morrer de novo, aos poucos, sonolento, sem sentir o peso da morte, ou seu beijo. A não ser que seja doce, o beijo da morte. da cúpula doentia de concatenações. (morri). Se me vejo no velório, bem, se não, amém. Hoje eu morri, meu corpo aqui decompõe. Sujo. Dentro dele, nada mais que barrigada. Um coração podre. Um cérebro inutilizado. Pernas que não voarão nunca mais. Junto de mim, estão meus princípios. Amanhã morrerei, de novo, para renascer quem sabe, da fétida conclusão de meus sentimentos. Saberei amar novamente? Depois de tantas e tantas conquistas decepcionantes. Ai, que vontade morrer!
A lua caiu na minha cabeça. Aí como dói, ai como dói. O peso da lua. 

Amor à primeira vista


Vi os olhos azuis
que só olhavam pra mim
mas eu não olhava assim
com esperança de ver
então, enfim, 
cansou-se de mim
decepcionei-me, 
sem ganhar nenhuma flor
meu primeiro amor
começou no vácuo
e terminou sem ter um fim
(Triste poética da voz
que insiste em rimar
algo que foi apenas
um flerte no ônibus).

Poema do nojo

Em homenagem a Baudelaire


O mundo das fezes
das cétidas (palavra cagada)
O mundo das prezes (palavra cuspida)
das mortálias.
Quem entender esse poema
que cuspa na minha cara.






terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Por favor, atenção!


Chamo-o do que quiser. Disse raivoso, depois de noites e noites tumultuadas e cheias de preocupações. Caóticas. Não quero mais entreter suas aflições e nem alimentar seus ciúmes. Preciso ser livre. Livre dessa necessidade constante de carinho e atenção. Do choro que me persegue. Acabo me envolvendo com (ELES, ESSES), tenho que usar os dois pronomes. Esses estranhos meticulosos, eles, imprestáveis. Desdotados de caráter. Gosto de inventar palavras. Desdotados é a melhor palavra para descrever esses imbecis que se envolveram comigo. Hoje choro. Não por eles. Mas por quem ainda não veio. Chame-me do que quiser. Sou dependente químico, da química corporal, do feeling de atrações e volúpias que sinto quando chego perto de alguns homens bonitos. Foi aqui que acabou o namoro. Chamei-o do que quis. Agora sofro com a solidão. Chorei um dia. No outro queria outro. Aprenda a me chamar. Dar-lhe-ei atenção redobrada se preciso for. Contudo, choro as lágrimas do silêncio. A vida é assim. Solitudica. 

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Tempo louco roda viva


Um tempo será
um tempo serei
Um tempo serão
cerão
cera
tempo encebado

um tempo trepei
um tempo loucura
um tempo tesão
terão
pera
tempo acabado

Um tempo de amor
um tempo paixão
um tempo acabei
pézão
morbidez
tempo chorei

quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Corpo de concreto

o corpo nu
concreto, duro, esguio
distante de mim
solidão, concreta?
Paixão, esguia?
o corpo nu que não tenho
massa de concreto
estátua viva
esboço de amor
o corpo nu que quero
tijolos, construções do eu,
enlace.
pensamentos duros?
memórias esguias?
o corpo nu que estranho
todos dias
novidade
concreta, edifício em mim
merda pútrida fétida
o corpo nu
que sonho!

sexta-feira, 23 de novembro de 2012

Menina cantando. Para Suelen Fernandes

Menina que eu amo demais.
Se poesia falasse
a minha gritava
mas como ela só diz
só posso falar
que quero te amar
continuar
sempre mais
a cada olhar
em cada toque da música que ouvimos
no violino do nosso amor
no piano dos nossos sonhos
Acho que minha poesia canta
no fim da contas..

Dúbio, Dário, Leandro, Dúrio, Dábio.

Dúbio diz: Faltou uma escrita...
Dário diz: Faltou não, era preparada aos poucos.

Era uma vez,
fazia tempo que não começava um texto assim,
desde que fazia ver os olhos nus dos meninos do futebol.
mas poema pra Sonia, todo sujo assim, pecado?
Não, Sonia é vida querida, vale tudo.
Agora que eu to falando, falo o que quero!
Viva Sonia???? Vivaaaa, Dúbio e Dário gritaram.
Quem é Sonia?
Uma louca lá perdida! Disse eu. Mas continuei,
Sonia é vida.
Vida louca vida, como dizia uma parente de viadagem.
Sonhei com ela rodando no mato!
No mato?
Mato não, campo, florido...
Tinha muita flô lá meu bem?
Tinha tudo que é tipo. Roxa, amarela, branca, preta, marrom, empapada, enegrecida, florestuda.
Florestuda?
Difícil encontrar o néctar querida!
Ahn, mas quem é Sonia?
Uma doida lá, Sonia da maluquice, Sonia da vida,
Da vida não, continuei, de vida, cheia de vida...
Cheia de graça, já valha-me Deus ter conhecido
Nossa senhora tão igual, Cheia de graça,
Nossa senhora da Sonia da doideira.
Mas a Sonia é santa?
Santa não, continuei.
Só aparecida, Minha santa
Minha viva alma alegria.
Quando a vejo sorrio.
Então Sonia é palhaça? Dábio e Dúrio perguntaram juntos.
(esses dois, hum, num sei não)...
Dizia eu:
Sonia é palhaça sim, mas é palhaça de amor
Palhacinha que faz rir, quem palhaça, só vê alegria nas coisas, continuei eu, quem palhaça ama.
Então a Sonia é perfeita, continuou os viadísticos.
Não, Perfeita não, pra isso
precisava ser homem, e casar comigo.
Do contrário, perfeição é folia.

sexta-feira, 16 de novembro de 2012

Desespero



Quero cair no chão e gritar, mas não posso, tem pessoas ao meu lado. Queria poder fugir, mas não posso, meu amor precisa estar aqui, para abençoar este lugar. Queria entregar-me ao som. Estou doente, e não sei como vou melhorar. Quero voar, o mais longe que puder, mas até meus pensamentos são controlados pela moral. Talvez não haja mesmo saída. Talvez eu peça pelo sofrimento. Pode ser eu? Se for, talvez seja hora de fazer o que eu quero de verdade. Talvez eu deva cair no chão e gritar. E é só o que eu quero. Se meus gritos forem ouvidos, terei amores e riquezas. Sei que sim, que não quiçá. Amor perdido, nunca mais volte aqui! Deixa eu gritar. Para de tentar. Tente, sorria, permita-se sofrer, chore; Vozes da alma. Queria poder cair no chão e gritar. Acho que preciso de ti. Meu novo. Jogue-me no chão, e me empurre para o que eu preciso fazer.

sábado, 20 de outubro de 2012

Diferenças


Nasceu um menino. Ele tinha olhos especiais. Via o que ninguém conseguia ver. Era um menino especial. Ele via os homens todos diferentes uns dos outros. No modo físico mesmo. Ele via um verde, um amarelo e um azul. Um com nariz comprido, outro pendurado, outro com boca rústica e outro meio sem boca, um com cabelos de macarrão e outro com fios de seda. Ele via uns gordos e uns magros. Ele via uns muito muito altos e outros muito baixos. Mas nós não vemos isso. Todos são iguais. Todos têm ao menos a mesma forma no nariz e na boca, ou pelo menos isso. Ele não aprendia a falar nada porque ouvia cada homem usar uma língua diferente. Ele não comia porque cada homem descrevia a comida de um jeito. Era como se o mundo fosse uma torre de babel constante, mas apenas ele percebesse a diferença. Era como se nós fossemos cegos para os outros. E éramos. Nós nos entendíamos, por exemplo; Se um falava uma língua e outro outra, o um entendia sua língua quando o outro falava outra e vice versa. O outro via a aparência do um igual ou semelhante a dele. Enquanto que o menino especial via cada coisa de uma forma diferente. Aconteceu que o mundo era louco. E o menino morreu de fome.

quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Poema da frieira

Acordei com uma frieira.
Minha única companheira
nas coceiras do dia a dia
Oh frieira querida
Oh frieira amada
Deixa eu coçar-te 
Amar-te em adorno aos dias
As luas que não surgiram
Nem aos sóis que virão, quem sabe!
A minha amada frieira

terça-feira, 25 de setembro de 2012

Uma poesia e um segredo.


Você!

Sorriso!
Aproximação!
Bobo!
Indecência!
Apaixonados!

Querer!
Unidade!
Entrepostos!

Emparelhados?
Um!

Tamanho?
Estabelecer!

Amor?
Megalomania!
Orgulho!
?

Sim

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Porquinho da Índia - Manuel Bandeira


Quando eu tinha seis anos 
Ganhei um porquinho-da-índia.
Que dor de coração eu tinha
Porque o bichinho só queria estar debaixo do fogão!
Levava ele pra sala
Pra os lugares mais bonitos, mais limpinhos,
Ele não se importava:
Queria era estar debaixo do fogão.
Não fazia caso nenhum das minhas ternurinhas...
- O meu porquinho-da-índia foi a minha primeira namorada.

quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Olhos revirados



Quereria seus olhos. Seus olhinhos revirados. Eles giram de um lado a outro, ou seria, caminham? Eles se deslocam procurando meu rosto. Eles me amam. Seus olhinhos revirados, rodando e rodando. Seus olhinhos brilhantes. Seus olhinhos de carinho. Seus olhos, pequenos abismos de imensidão. Dentro deles vejo animais rastejantes do deserto; olhando as estrelas. Eles giram e giram, os animais, no deserto. Estão revirados. Eles caminham? Seus olhos de imensidão. Azul do céu. Um quasar perdido no espaço. Um buraco negro de hipnose. Seus olhinhos revirados. Meu amor, os olhinhos do meu menino. Os olhinhos do menino que me tem. Quereria seus olhos. Quero. Arco-íris de paixão. Íris. Os olhinhos do meu menino, que giram e giram de um lado a outro. São os olhinho do meu amor. A luz das estrelas do deserto. Eles caminham?

terça-feira, 11 de setembro de 2012

Do desejo


Talvez uma volúpia. Sim! Como se o mundo quisesse gritar, gemer de prazer. O mundo, sim! O mundo! Imagine o mundo como um grande corpo. Com uma boca, lá pelos lados do mar negro, ou seria mar vermelho? Isso depende de qual parte do corpo ficaria no oriente! Mas enfim, vejamos o mundo dessa forma. Qual seria a volúpia do mundo. Seu desejo? Talvez gritar. As fortes ondas de som que o planeta terra provocaria poderia empurrar as estrelas e quiçá a lua. Sem aquela companhia desagradável se escondendo em seu lado escuro. Todo mundo tem uma lua. E é do desejo do mundo todo, (das pessoas que nele vivem), que essas pessoas fossem engolidas pela grande boca do mundo. 

quinta-feira, 6 de setembro de 2012

Ação II

PS: "Ação I", no livro (in)completas, a partir de Novembro.


Queridos, quero escrever isso como uma carta. Não me confundam, não sou o escritor. Eu apenas sou alguém que não sei quem, como já dizia o poeta. E que está a procura exacerbada de um desabafo. Um meio para o qual tirarei uma dor muito grande do meu peito. Uma dor de amor, que não é amor, que de corno, mas o corno não sou eu. Pois é gente! Talvez esteja na hora de tornar os fatos públicos. Desamarrar as amarras. E ver o mundo de uma maneira mais leve. Enfim, vamos aos fatos: Conheci um ruivo no ônibus. Ele era muito bonito, do tipo de cara que se olha e fala, putz. Palavra nova inserida no dicionário pela boca do povo. É uma abreviação de PUTA QUE O PARIU! Expressão que denomina espanto, alegria, euforia, tesão. Eu olhei e disse. Putz. Naquele momento fiquei imaginando ele pelado. Era inevitável. Dizem que os ruivos metem bem. Não sei. Dessa fruta rústica eu nunca provei. Ou tinha provado. Já eu falo o porquê. Entrou no ônibus. Cabelos alaranjados, pele branca, barba larga. Um rosto milimetricamente reduzido a perfeição. Umas sardas, queria poder ter contado. Ele me olhou. E eu já o estava olhando. Virei o olhar, não vi o que ele fez. Mas estava meio que atrás de mim. Na diagonal. E eu conversando com uma ex funcionária de casa. Frequentemente olhava para trás, esperando encontrá-lo, e lá estava ele. Com uma mala branca e azul no chão. Chegando de viagem, talvez. Então, se colocou bem atrás de mim. Eu já estava até feliz, achando que ia ser encochado, (palavra que define o ato de colocar suas cochas sobre as cochas de outra pessoa, atracando-se sexualmente em tom menor, ou seja, de forma sutil). Estirei o bumbum para trás. E uma senhora o levou para a parte de trás do ônibus o empurrando. Fiquei a olhá-lo, por entre pessoas. Esperando que dele viessem alguns olhares furtivos. Mas deixei olhá-lo por distração, ou medo de acanhá-lo visto que algumas pessoas já estavam encarando nossa relação. Surtei. Não havia relação. Por favor. Minha mente traiçoeira! Quando o procurei, não o vi mais. Ele havia sumido. Pensei, desceu em algum desses bairros. Toquei a vida, pensando naqueles pelos ruivos. Será que são todos assim? Ruivos metem bem. Agora sim, afirmação. Porque no outro dia o re-vi. Estava lá, na fila do banco, enquanto que eu pagava contas. Saí do caixa, esperei que ele saísse do banco, para seguí-lo, meio de longe, distante. Dito e feito. Saiu do banco. Começou a andar e me pus atrás dele. Ele se virou e me viu. E continuou a andar. Até que passando entre ruas e ruas e ruas. Entrou numa casa, e ficou a porta, sem camisa. Aquela pele branca, e eu passando em frente, olhando-o discaradamente. Ele colocou o dedão da mão direita no cós da calça, abaixando-a, deixando a mostra todos os pelos ruivos. Eu surtei. Entrei na casa. Um cachorro veio em minha direção, congelei. Ele afastou o cachorro e sem dizer uma palavra, me guiou até a sala. Tirou a calça, e só de cuecas, me ofereceu uma bebida. Aceitei, meio zonzo. Nunca havia me ocorrido nada do tipo. Esperei que o amor não viesse. Então retirou minha camisa com seus dedos. Beijou meu corpo e minha boca. Jean. Até que enfim, um nome. Lindo. Coloquei minhas mãos sobre ele. Retirei minhas calças. Jogamo-nos no sofá. E ali, sim ali. Coloquei tudo que havia em mim a trabalhar. Boca, mãos, corpo, pinto, cu. Agora sim. Ruivos metem bem. Afirmação. (Repetição espontânea). Quero o mundo em mim. Queria ele para sempre. Vamos nos encontrar hoje. Para um jantar. Nunca esperei conhecer um namorado no ônibus. Quanta trairagem. A vida é traiçoeira.

Obrigado por ler meu desabafo.
Estou profundamente agradecido.

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

O tempo do amor


Aquilo era o inferno, as almas estavam espalhadas no chão, pessoas na lama. Pedindo misericórdia. Aquilo tudo, cena horrenda, podia ser vista dentro do coração do menino. Perdeu seu amor. Não sabia se era ou não o verdadeiro. Não sabia se iam se encontrar novamente. Apenas sabia que aquilo era doloroso. Queria encontrar alguém ainda melhor, mas achava impossível. Demorou tanto para que tudo acontecesse. Em pouco tempo, tudo terminou. É terrível realmente. Em algum tempo, pensa que tudo foi melhor assim. Que logo outro virá. Que esquecerá. Em outros, pensa que nunca mais encontrará ninguém. Era amor de verdade. Pelo menos para ele. Retribuição? Dúvida. Amor? Existe? Só por nós mesmos; E o famoso idealista que dizia: Amais ao próximo como a ti mesmo. Era idealista. Os que amam, sofrem. Penúria. Os que amam, sofrem. Há mesmo Shakespeare entre nós. Queria que houvesse. Um Romeo, o ideal de amor perfeito. Queria que houvesse. Já que não há. Contentar-se-á com os que aparecerem, os Romeos. Com vicios, virtudes, os loucos, os apaixonados, os frios, e os quentes. Cada um é um. O tempo dirá. E talvez é aí que está o problema do sofrimento no amor. O menino não deixou o tempo falar, ou então não o consegui ouvir. 

quarta-feira, 29 de agosto de 2012

Criancinhas





Desde criancinhas
Pulando e pulando
Cirando, girando, gritando
E a senhora da esquina bravava
E a lua não descansava
E a gente corria
Desde criancinha
Dançando e dançando
Ciranda, ciranda, esperança
E o mundo girava
Devagar, e a gente acompanhava
Tentava correr como avião no céu
E gritava
E a senhora da esquina bravava
E a mãe chamava o jantar
E a lua, a lua não descansava
Desde criancinha
O mundo era engraçado
E a senhora da esquina bravava
E esse era nosso único problema
Hoje, adulto
Adultina, doença!
A gente trabalha
Trabalha e chora
E sustenta
E paga
E vota
E o mundo continua girando
E a gente só se cansa
E quer o mundo como o mundo nos quer
E tudo que a lua faz é descansar.

quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Carmesin?

Me falaram das flores de Carmesin, que porra é essa? Se escreve com m ou com n no final? Sei que achei essa merda toda linda. Ah, o sexo, a frutificação prazerosa do amor. Se Carmesin desse fruto, ele se chamaria Carma.; teria um sabor misto de manga e morango. O carma do sexo. Vício arredio que aniquila. Os sonhos que se concretizam. É o amor. Acho então, eu, que flores de Carmesin, recitadas ao pé do ouvido são flores de sexo. E aí de mim, hoje, que vou ao jardim.




Antes que algum anormal me diga que carmesin se escreve com m e não com n, eu aviso que é proposital o erro.

terça-feira, 14 de agosto de 2012

Carrossel

PARA LILLIAN SALLES



Passeava no campo, com as flores no derredor. Abria os braços, finos e delicados, e rodava em meio ao capim, seco, florido, como um carrossel, o sol que batia no rosto dava vida a ela. E assim ela continuava a sonhar. Sonhava com os namorados que foram embora, mas que ainda não haviam sequer aparecido. Nenhuma vez. Sonhava com a noite que chegaria daqui a alguns minutos, quando o sol começasse a se pôr, e que nessa noite ela via alguns anjos caminhando ao lado dela. Talvez por isso ainda estivesse ali. Sentindo o perfume das flores. Eu a via, com vestido de renda e algodão, toda fresca. Eu a via de longe, da janela de uma casa distante. Eu a via porque estava o dia todo olhando para ela. Eu via essa menina, que rodava e rodava como um carrossel. E ela sonhava. E sonhava com as flores ganhando vida. Com as estrelas que passeavam no seu corpo, como abelhas a procura do mel. E ela sonhava com anjos caminhando ao lado dela. Eu a via. A via porque o sonho dela ia se realizar. A via do alto das nuvens, da casa distante, construída em cima de uma nuvem, no céu. Que logo iria escurecer. Eu a via de perto, caminhando ao lado dela. E minhas asas a abraçavam

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

O duplo


Eu sou dois. O duplo. Canto a vida como se fosse minha, mas em mim existem dois. Dois seres distintos e com vontades próprias. Eu digo, desista. E ele me diz, vá em frente. Enfrente. Eu digo, amor. Ele diz, pense. Quem sabe um anjo em mim? Talvez nos sonhos de uns dias. Pois em mim, existem dois. E meus sonhos não são só meus. Eu digo, paciência. Ele diz, paciência é o caralho. Talvez eu esteja apenas projetando meus sonhos. Quem sabe meu eu interior, ou o eu verdadeiro, seja mais bonito e mais forte. Talvez eu seja apenas a manipulação e não o manipulador. Há em mim, dois de mim. Há em mim, um outro eu.Talvez um eu interiorizado. Um eu de mídia. Faz sentido, quando pensamos na manipulação. Mas não sou um resultado de projeção mental. Sou um que sou dois. Eu tenho dois em mim. Não são dois lados. Bem e mal. Não. Definitivamente não. Sou apenas dois, porque eu penso, e duas cabeças pensam melhor que uma?!!! Sou dois então, enfim. Sou dois. Dois de mim. Duas entidades, talvez seja porque ultimamente, tenho pensado duas vezes em tudo, para decidir melhor. Quem eu devo matar para sobreviver. Preciso de dois de mim. Para me manter na selva. Dois de mim para que eu consiga passar os dias comigo mesmo. Sem estar sozinho. Dois em mim. Aqueles dois. Que se amam. 

O bobo



Era um sorriso bobo, bobo, etc. Mas mesmo assim me encantava. Eu que esperava ouvir sonetos e canções eruditas, que sonhava em ver Camões em meu quarto falando sobre as ninfas e os cupidos, eu que sempre amei a inteligência e admirei quem a tinha. Estava apaixonado por um bobo. Um bobo que ria em espasmos, grunhia palavras, com voz grossa e abafada, e que empilhava ofensas em tom de riso, para me provocar somente. E eu deixava-o; Que fizesse o que queria, ele podia tudo; Que sonhasse o que pudesse, bastava que eu estivesse em seus sonhos; Que beijasse quanto quisesse, desde que a mim, e somente a mim. Que se apaixonasse... enfim, na luta da conquista que se fez, em olhares furtivos, com as mãos que esbarravam.

quinta-feira, 21 de junho de 2012

Abandonados

A pele branca, os pelos soltos, carne na carne, em vãos sonhos se entregam os amantes a luz do abajur. Pouco aceso. Luz fraca. A volúpia se torna frequente, intensa, em pouco tempo o movimento se transforma, vira uma pintura, uma música, uma dança. Havia música, um ciello cheio de vida e melancolia, ouvia-se o respirar ofegante do musicista que não desafinava. Nossos olhares cruzando-se em véus de calor. Os poucos minutos juntos eram suficientes para que nós pudéssemos ser felizes. Ali, num sofá, jogados na sala, ao lado do vinho. A luz do abajur apagou sozinha. Ficou uma velinha acesa. Jogamos o livro para longe, e reconhecemos o amor. 







quinta-feira, 14 de junho de 2012

Ânsia por escrever


Quinta Feira: 17/04/1988

Ânsia por escrever!

Tudo que eu esperei de você hoje foi um motivo. Um belo motivo. Para entender sua alma e sua bondade. Durante tantos anos de convivência, você só se preocupou em trazer-me paz, amor e carinho, que recebia como se fosse o único. E era! Sempre. A verdade é que hoje não tenho o que dizer. Você foi embora. Deixou-me suas roupas, discos, os livros empoeirados. Sabe? Pareço ainda sentir seu cheiro pela casa! Vejo vultos, sua presença ainda está aqui. Tenho a dizer que sinto falta daquele olhar comprimido. Azuis esverdeados. A aurora em seus olhos. Deixa eu dizer que sinto falta do seu toque. Da barba malfeita. Por isso tive ânsia. Ânsia por escrever. Não posso deixar que parta como um papel usado e velho. Volta? Me diz um motivo... para não sair à rua gritando... à porta da sua nova casa! Aquela que tem as paredes meio mofadas? Sim... se não me engano é essa... esperarei uma resposta antes de partir. À sua procura; Deixo essa lágrima como recordação!

Com amor...


Quinta Feira: 24/04/1988

Destinatário falecido.

Arma. Branca. Faca. Corte. Pulsos. Fracasso! Garganta! FRACASSO! Coração. Sangue. Chão. Carpete. Sujeira. Mofo. Sufoco. Fracasso. Ilusão. Sonho. Retrospectiva. Sonho. Fracasso. Pulmão. Sufoco. Ar... Ar... Ar...

Boletim policial: 24/04/1988

Causa da morte: Suicídio
Hora provável: 15:33
Sexo: Homem, 25 anos, Caucasiano.

Provas?
Um bilhete.

Querido, vou te encontrar!

Literatura em música !!!

Simples assim:

Não trocaria um sorvete de flocos por você - Soustripper



Visão II

Seu sorriso me encanta, é como volúpia para os olhos, como uma fonte no deserto, com uma estrela na mais escura noite. Seu sorriso é meu motivo de sorrir. É nele que penso todos os dias, todas as horas, todos os minutos. Sorrisos são os rios do futuro e os mares do passado. Pois deles brotarão vida



A vida que pedi é a que tenho, a vida que quero é a que ainda devo pedir !

sexta-feira, 8 de junho de 2012

Sem título


Porque existe a separação? É tanto porquê em minha vida que ultimamente ela se resume a isso, perdeu o sentido, a vontade de viver realmente. Porque as pessoas não se amam? E quando se amam, são tratadas como anormais, por quê? São coisas que eu não entendo. Se é errado abraçar e beijar, e acariciar. Se não vale a pena amar. Se todos nós somos estranhos que não se pode chamar pelo nome. Moço, moça, senhor, senhora, desculpa dona! Que grande vadiagem!
Aquele João da esquina me encanta, com pernas a mostra. Ele me atrofia os nervos, e me deixa em espasmo. É ele que é o demônio a comprar minha alma. Porque demônio mesmo não existe. Existem demônios, aquele é meu demônio, o mal que existe em mim.
É essa minha revolta, não poder amar quem eu quero. A minha vontade é sair com o pau a fora, jogando de um lado a outro... A merda na cara dessa sociedade escrota. É até engraçado dizer essa palavra. Escrota. Já que estamos falando de pau. Cansei de ser santo. De ser sertinho, com s mesmo, que é pra esculachar de vez essa merda toda.
Mas essa revolta toda vem dessa pergunta que não cala desde o começo desse desabafo. Porque existe a separação? Já que sem esse porque tudo começa a fazer sentido. Se eu pudesse eternamente amar. Ele não morreria e eu não estaria aqui a jogar objetos na parede mofada.

segunda-feira, 4 de junho de 2012

Poemas inéditos de Drummond, transcritos de fac-símeles, publicados na Revista Bravo (Junho - 2012)


PS: A transcrição foi respeitada, por isso, os erros e diferenças na escrita. (Isso inclui a acentuação)


A sombra do homem que sorriu

Ah! Que os tapetes não guardem
a sombra inútil dos meus passos...
Eu quero apenas ser, apenas,
um homem que sorriu e que passou,
erguendo a sua taça, com desdém.


Primavera nas folhinhas e nos jardins

O perfume das rosas entra-me pelo quarto,
numa lufada de primavera.
E eu fico, desvairado, a sentir o perfume,
o perfume das rosas, pelo quarto...

Numa lufada de primavera!

Que bom, ler os poetas sadios,
e não saber da lua, das estrelas,
e não saber do amor! E não saber de ti!
(De ti que és pallida e feia,
pallidamente  feia e melancólica.)
Mas apenas sentir, allucinante e forte,
o perfume das rosas, pelo quarto
numa lufada de primavera!

Quasi – Nocturno, em voz baixa

Tuas mãos envelhecem,
na prata fosca do silêncio.

O silencio, pelo crepúsculo,
é um arminho
onde as mãos repousam com doçura.

Tuas mãos no silêncio, pelo crepúsculo, são mais finas
e mais leves.

O silencio, o doce silencio,
vestiu de cinza transparente
as tuas mãos, pelo crepúsculo.


Vê como a agua sussurra

Vê como a agua sussurra no fundo dos tanques ermos,
como a agua, intimamente, chora.
E na face dos tanques ermos
boiam flores azues, grandes flores indifferentes.

A agua espadana no ar, em florido repuxo.
A alegria da agua, subindo
sobre a indiferenã azul das grandes flores!
- Vê o repuxo cahindo
Novamente, sobre tanques ermos.

Nos jardins,
A ironia da vida é feita de belleza

(Que ridiculo pensamento...)


Gravado numa parede

Saber que tu não virás nunca encher de rosas o meu quarto,

encher de belleza a minha vida...
e continuar á espera, de mãos vazias...

Saber que não partirás o meu pão, que não beberemos juntos,
ao jantar, um pouco d’aquelle amável e grato vinho velho,

que não acenderás a minha lâmpada,
que o piano não possuirá os teus dedos...

Saber tudo isso, o impossível e o irremediável
de tudo isso... e continuar sonhando inutilmente.

Ah! Por que não virás encher de rosas o meu quarto?

Ao menos,
vem encher-me de lagrimas os olhos.


A mulher do elevador

A que ficou lá longe, na grande cidade...

A que eu vi apenas um minuto, um minuto somente,
no elevador que subia.

Com que saudade inédita eu me lembro
da que não foi nem uma sombra, uma sombra fugaz
no meu destino.

Da que ficou, sorrindo, com um pouco de mim,
com um pouco do meu ser anonymo e vulgar,
a milhares de kilometros, na grande cidade...

segunda-feira, 21 de maio de 2012

sábado, 19 de maio de 2012

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Flores

São flores que estão no caminho, rosas, amarelas, brancas, azuis, são flores. O caminho as vezes é torto, mas a semente que caiu da mão da senhora que andava a beira da estrada cresceu e deu frutos, ou melhor dizendo: flores.  Perfumes diferentes alastravam-se pelo caminho e chegavam ao céu azul, o caminho estava ao fim. E é agora que um novo caminho se segue, meu caminho se divide em dois, e ao longo da vida, eu é que deixo as sementes na beira da estrada. Perdida e calma, cansada, tenho que escolher entre dois falsos amores, são flores que apodrecem no caminho. Escuras, amarelas, sem cores, são flores.

Amor

Pulei do sofá ansioso, entregando-me nos seus braços, se alisava insistentemente ao som do melódico jazz de Nat King Cole, todavia, partindo seu corpo ao meio em uma curva retilínea buscava com as mãos em laço meu corpo, mexendo-se encostou seu beijo ao meu, e a pele áspera se encontrou a face minha, e finalmente, seu sorriso alargou seus lábios firmes, sempre sérios, fixou o olhar, e como se admirasse estrelas abriu a boca não deixando espaço para as palavras, pudor, pudores berrantes da noite silenciosa recuavam dando espaço para a falta, naquela insônia que não me permitia descansar, senti seu tronco balbuciando uma expressão, subiu lentamente encostando os pelos macios nos meus poucos, a força, entregue aos pequenos detalhes do dia, deixava de existir e doce, seu corpo se entregava à medida que com a língua sentia seu gosto, e da língua, da mão, e do corpo, o que parecia ser o fim do mundo era apenas o amor.

Habilidades

Me apaixonei por isso, ele passava os dedos com tanta agilidade no piano que sua voz era transmitida pelo instrumento, sabia quando queria dizer que me amava e quando estava bravo, as notas agressivas indicavam que eu deveria me calar no momento. Mas quando tocava Bachianas nº 5 via sua habilidade. seu sentimento, sua paixão. Era ali que ele se desmembrava, deixava as mãos e os braços trabalharem sozinhos enquanto se sentia de formas variadas, podia passar pelo ódio e pelo amor, pela saudade e pela plenitude, pela tristeza e pela alegria, quando saia do piano sempre usava os braços longos para me abraçar, não importasse o que estivesse fazendo, um beijinho na nuca e se afastava para descansar. Noites no bar. Pianos tocando. Jazz. Homens inusitados. Beijos na nuca. Doses de Gyn.

O cortejo

Caminhando em direção a tristeza, o cortejo passava, em pessoas as lágrimas correndo dos olhos envoltos por uma nuvem escura. As cores são poucas: preto e vermelho nas roupas, branco nas flores, e o azul do céu sem nuvens daquele dia de sol quente o suficiente para queimar a ponta de minhas orelhas desprotegidas pelo protetor solar. O suor escorria pelo rosto da viúva e abrandava o aspecto frio de sua expressão monótona quase invisível debaixo do véu negro. E chegando às cinco horas, pelo último adeus, fugiu o dia quente e a chuva que não ameaçava o tempo caiu lavando as tristezas e deixando para trás toda a vida restante no corpo morto agora encontrado no túmulo.

Esperança

Tudo por mudar. Não sei o futuro, mas sei que pensar no pior, só vai me fazer sentir-me mal. Pode existir uma luz. Hoje, amanhã. Ontem, nas memórias perdidas. Nos beijos roubados. Uma saída. Os sonhos movem as pessoas. Os sonhos e a vontade Os sonhos são sem nexo. A vontade os organiza. Um homem sem sonhos é medíocre. Um homem sem vontade é acomodado, passivo do mundo. Todos os dias flores nascem. Estrelas morrem. E pássaros cadentes permeiam meu amor. A esperança é o que nos move.

Momento


Sabe do que eu to precisando, daquele carinho, aquela barba na minha nuca, o beijinho doce, o aperto, to precisando de um flerte, de um homem, forte, to precisando é disso mesmo, eu cansei de tentar lutar por amores verdadeiros e políticos honestos, ultimamente ta valendo mais isso, o momento. Aquele abraço, Aquele!
Quero seu amor perdido e encontrado, sua voz grave e doce, seu abraço suave e forte, não preciso de definição, eu preciso é de sexo. Agora vou fazer minha barba pra ir trabalhar!

Seios e borboletas


Quantos seios são precisos para que o amor se concretize? Quatro. Seios soltos na noite, na cama, no vento, no quarto, na varanda, para que todos vejam. Seios loucos, amasiados, cúmplices. Seios vãos, sem ocupação. Livres da tortura masculina. Seios alegres. Quantos seios são precisos para que o amor se concretize? Porra! São quatro caralho! Caralho não, só seios. Seios e borboletas, que voam pelo jardim, a procura de suas companheiras, seios e amores, seios e belezas, seios e loucuras, seios e borboletas.
Aquelas duas moças por exemplo, são como pássaros voando na alegria dos olhares alheios, pássaros não! Borboletas! Coloridas e alegres. Percebível alegria no interesse masculino, desejo. Mas a alegria está em não ser desejada por eles. Mas por poder voar pelo jardim da amiga, a procura de borboletas. Que sejam como são, azuis, pretas, amarelas, brancas, roxas, vermelhas. Seios esvoaçantes na noite. Borboletas elásticas e contorcionistas. Seios e borboletas.

Rusticidade morta

Queria as estrelas ao meu céu, com sua língua invadindo minha boca, pertencendo ao escárnio de prazer, meu e seu, os olhos mudos. Como se ousassem falar, através de uma lágrima, ou um sorriso. Quero os amores que se perderam. Poder voltar no tempo e ver seu olhar me encarando de novo, queria que as estrelas engajassem nosso beijo e que a lua selasse nosso amor com um eclipse iluminado. Hoje o céu sorriu pra mim, como em um filme. As nuvens se foram, e ficou a limpidez. Deixa amor, tocar-nos, elas só vão nos unir mais e mais. Apresenta-se a mim. Aponta-me como seu. Estica seu braço por meu ombro e diga que me ama. Que está com saudades e que me perdoa, por ser tão infeliz longe de ti.

Estrelas no céu da boca

Queria as estrelas ao meu céu, com sua língua invadindo minha boca, pertencendo ao escárnio de prazer, meu e seu, os olhos mudos. Como se ousassem falar, através de uma lágrima, ou um sorriso. Quero os amores que se perderam. Poder voltar no tempo e ver seu olhar me encarando de novo, queria que as estrelas engajassem nosso beijo e que a lua selasse nosso amor com um eclipse iluminado. Hoje o céu sorriu pra mim, como em um filme. As nuvens se foram, e ficou a limpidez. Deixa amor, tocar-nos, elas só vão nos unir mais e mais. Apresenta-se a mim. Aponta-me como seu. Estica seu braço por meu ombro e diga que me ama. Que está com saudades e que me perdoa, por ser tão infeliz longe de ti.

Lágrimas e sonhos

Como o amor se comportou diante de mim? Sempre perguntei isso. Nunca entendi. Sempre alertei a vida com olhos fugitivos, encantei a noite com gestos perdidos de saudade, procurei maravilhas nos pensamentos. Precisei de você. Não estava aqui perto. Queria lembrar dos seus olhos chorosos de saudade, felizes pelo amor que passou, e que um dia, se quiseres, terá de volta. Os passos vãos pela madrugada em pensamento são fonte de consolação, já que escapo da realidade. Em minha cama, deitado, sem luzes, entrego-me inteiramente aos devaneios. Tentando encontrar você no pensamento. Precisando da verdade que há em ti. Queria encontrar respostas para minha pergunta sem sentido. Porque o amor se comporta assim diante de mim? Como quem foge da tempestade no deserto. Com quem vê um oásis de belas paisagens numa miragem. E como uma miragem, foge da realidade, causando essa sensação impossível. Essa emoção de deixar os sentimentos soltos, presos. Porque o amor se comporta assim diante de mim? Nunca entendi. Essa resposta deve estar além dos meus devaneios. Das miragens, das ruas perdidas e fantasiadas no meu pensamento. A única coisa que tenho a absoluta certeza no momento é de que essa resposta não está em mim. Eu devo sentir em ti o que aconteceu para que me entregasse de bandeja essa pergunta que redoma minha mente dia a dia, de noite em noite. Impedindo-me de dormir. Solicitando minhas forças noturnas para encontrar uma resposta nos sonhos. E para sentir em ti. Eu preciso estar em ti. Então por fim, aceite esta flor, construída de sonhos e lágrimas, mas que em dado momento, me permitirá conseguir penetrar seus sonhos, quando esboçar por mim um sentimento qualquer, e assim me ajudando a encontrar a resposta para essa pergunta que me atormenta. Porque seu amor se comportou assim, diante de mim?

Criando asas

Sabia que os olhos dela são como olhos de anjo? Eu não conheço olhos de anjo, mas um dia vi um em um sonho, melhor dizendo, uma. A noite passou tão depressa que eu nem ao menos pude aproveitar tal deleite. Nos meus sonhos os anjos tinham sexo sim. Eu sei que tinham. Por favor, não pense que sou tarada ou depravada. Eu só amo mulheres mais que homens. Mulheres que são para mim exemplo de sexualidade e beleza incomparáveis. São como a junção da lua e do sol num dia quente, primeiro o dia vira noite, mas depois o sol aparece incendiando as almas das pessoas desprotegidas. Sem carinhos. Amáveis. Elas ainda não sabem disso. O dia está quieto, a rua calou-se hoje e o copo de vinho a minha frente sustenta os devaneios da mente confusa, e volto a lembrar dos sonhos. Vi o anjo de novo, branco, e de repente estávamos nuas. A pele solta à luz. O sol atravessando as cortinas, e nós ali, paradas. Apenas nos olhando. As asas caíram e um brilho ofuscante pairou no ar
As felicitações são constantes, perdemo-nos nos corpos uma da outra, nos entregamos pela segunda vez. Mais uma vez afirmo. Anjos tem sexo. Após as esculturais formas se entregarem a mim de forma tão distinta. Ela vestiu suas asas, não como se veste uma roupa, era diferente. Voltou aos céus. Meu amor me tirou do transe. O amor é a verdade e a mentira presente em nossas vidas. É o entremeio. Volúpias no anoitecer introduziram meu terceiro encontro com o anjo. Flores na janela.

Transformação

Senti os colos tocarem-me, pedi para ser acomodado. Derrubei a tinta no chão. Elas se transformaram. As pedras queriam rolar, acabaram se misturando, transaram. Meu camaleão de estimação colocou-se diante do monumento desintencional. Ele se adaptou.

O reflexo

Entendo que o mundo está se apagando aos poucos. Conforme a luz do dia desaparece. A cada minuto. Hoje me olhei através de um vidro. Meu reflexo não é firme como em um espelho. É apagado. Como um fantasma sem vontade. Como um amor perdido na memória, o rosto parecia neutro. A boca apenas solucionava alguns mistérios de pensamento. No vidro, via outras pessoas com nitidez.  Mas eu estava perdido. Via o caminho pelo qual o ônibus percorria, correndo para casa, sozinho, vento no rosto. Dilúvio de solidão. O suor escorria com poucas aparições solares. Encanto.
Naquela viagem, perdido. Tentava encontrar um sentido. Porque aceitar um convite do beijo na noite que passou. Não via sentido no ato. Mas aceitei. O sol bateu de novo no rosto. Apontamentos. Os pensamentos criavam tópicos para que eu pudesse organizar minha mente solta. O reflexo continuava apagado. Via agora metade do rosto. Os pensamentos continuavam num frenesi de loucura e solidão.
Tentava me concentrar na música. Nada. Desisti do reflexo. Portanto, de mim mesmo. O dia passou. Ao chegar em casa dormi. O beijo não valeu tanto a pena. Poderia ter sido melhor. Robusto. Apaixonado. Faltaram os músculos, faltou o prazer. Faltou a loucura.

Paisagem

A praia e o mar me tomam, e me deixam perdido, sem saber para onde olhar, só vejo a luz que toma meus olhos do sol de dez da manhã, e o mar, a imensidão verde água que me atrai para dentro dele, não existe ninguém a minha volta, mas isso é o suficiente para que eu possa ser feliz, só admirar a paisagem. Uma prancha me é lançada pelo mar e me traz recordações, e em meio a minha mente, isolado e perdido, num frenesi de lembranças me mostro como sendo o que sou, um ser humano apaixonado pelo mar e suas histórias.

Solidão

Saí para me distrair do silêncio desta casa, parece que vivo em um deserto. O choro. As pessoas me olham e se afastam. Tudo permanece igual, não importa quanto tempo passe. A solidão é arrebatadora. É como se Deus enjaulasse o sol e a lua em extremidades opostas da terra, e deixasse-nos no escuro. Assim é meu coração.

Viva


- Eu te odeio com todas as forças do meu coração, filho da puta.
Virando os olhos e o rosto, deixou-se escuro devido a pouca luz que ali havia. Ocorreu-lhe brevemente que não queria assustar a moça, largou então o machado, que fez um barulho estridente ao tocar o asfalto. O carro parado. As luzes ainda acesas. A mancha no chão abaixo do corpo. Uma luta vazia. Corações partidos e remendados. Apostando tudo o que ainda havia para ser dito abriu a boca pronunciando suavemente.
- Largue dele e volte para mim.

Peitoril


Se quer saber, ontem eu vomitei a noite toda, e a culpa é sua! Sua sim, quem mandou me deixar a beira de um precipício sem saída. Pedi o fim porque não agüentaria mais tanta pressão. Casamentos encerrados para que fiquemos juntos. Crianças órfãs. Nesse deserto de solidão iriam se encontrar o seu corpo e o meu, juntos, lado a lado, enfrentando o amor da morte. Apenas abutres sobrevoariam nossas cabeças. Porque tudo isso tem que acontecer. Porque simplesmente não podemos ficar entre as opções. A liberdade para nós não existe mesmo. Não precisa ser a morte ou a vida, o amor ou a obrigação. Poderíamos apenas fugir. Deixasse a casa para trás, porque você desistiu tão fácil de mim? Chego a pensar que nunca fui nada. A casa pagaria a comida e o alimento escolar até que se resolvesse a idade das crianças. Sei que você pensava que iriam atrás de você de qualquer forma. Polícia; Família; Esposa; Exército; Marinha; Aeronáutica; Lampião.
Que maldição deixou em minha vida. A sina de vomitar nosso amor pela janela jogando escrotos na cabeça das pessoas. As pobres coitadas saem gritando. Maluco, Maluco, Doido e quando mostro meu pau na janela elas me chamam de jumento ou tarado. Estou assim! Sem juízo, por causa de você, a sanidade foi embora, e eu vomito mais. Os enjôos são freqüentes, mas não estou grávido, só com saudades. Por favor. Volte, Deixe sua mulher com as crianças, entraremos num acordo. Ninguém irá te matar! Fique tranqüilo. E daí que o pai dela é militar. Vamos escondidos a um outro lugar. Mande o dinheiro e pronto. Ninguém poderá te condenar assim. Família... Família... eis a condenação da liberdade, família e sociedade. Não permita que o mundo o deixe assim, infeliz, preso dentro de si. Eu to cansado! Cansado de ver-te assim, nem perdido, nem salvo. Cada vez que penso sobre isso volto a vomitar. E no vômito só sai água. Água insípida. Incolor e inodora. Sem vida. Só água. Ao mesmo tempo traz a vida e a tira.
Não to nem aí pro que vão dizer. Sinto-me como se nunca pudesse ser feliz. Como se tentassem a todo instante me impedir. Tem minutos que entendo sua posição. Eu não tenho ninguém. Você deixaria os filhos. O primeiro amor, que por mais que não fosse amor, ainda era alguém que te amou. Quem se ama não se deixa para trás. Entendo você, mas como vou vomitar em paz? Como vou parar de vomitar? Por favor, Não se recolha de mim, pelo contrário. Se abra. Eu olho as noites e os dias passarem pela janela, vejo as pessoas e me sinto um vagabundo. Sem ofício, sem visão. Sem motivos para entender que estou amando sem ser amado. Deixando de lado as vestes e me aproximando da lua, nu, ouvindo os gritos, Jumento, Tarado, não me deixe assim. Vou me humilhar sim, perder-me no peitoril extenso e jogar lá de cima excrementos.
Não to nem aí. Quero apenas parar de vomitar, já que você não está aqui, vou parar de sofrer por sua causa. Eu vou é dar que eu ganho mais, quem sabe me apaixono por outro alguém. Ou então desistir de vez e deixar passar o sofrimento dos meus dias bebendo vinho e escrevendo as loucuras que vem a minha cabeça, pichando paredes e entretendo a vida com a morte, e atropelando a morte com a vida.
Eu olho os comprimidos ao lado do vinho no criado mudo, vejo a meia luz do meu quarto abraçando as cortinas encurraladas no canto da parede e me vem uma vontade imensa. Depois dessa longa discussão com o vazio, me dou o direito de morrer.

Camaleão


Este seria o último dia normal da minha vida. Dormi, acordei, trabalhei, almocei, trabalhei, jantei, bebi, ouvi música, assisti um filme qualquer que estava perdido na estante, li um trecho de um novo livro, melhor dizendo, o livro não é novo, mas o meu exemplar sim. E fui me deitar. A noite seria comum, exceto por um detalhe. Naquela noite me transformei pela primeira vez.
Eu sempre odiei répteis, anfíbios, insetos, crustáceos e essas coisas nojentas, mas quando me dei conta, uma cauda estava crescendo em mim, verde e cheia de rugas e esporas estufadas para fora da pele. Logo as pernas começaram a mudar de forma. E não sentia dor. Era tudo normal e higiênico. Não havia nenhuma troca de pele. Como mágica as partes do meu corpo foram ficando verdes, a minha língua cresceu em cinco minutos, 40 centímetros, e o meu céu da boca quase foi parar no teto do crânio.
Os meus olhos se mexiam sozinhos, e a sensação que tinha era de que podia ver duas televisões ao mesmo tempo, em canais diferentes. Olhava as duas paisagens dos quadros pendurados, um em cada parede do quarto. Logo, enquanto um olho ficou admirando a paisagem, o outro saltou para ver a imagem de Maria ao lado de Jesus na cabeceira a frente da cama.
Os meus braços não se mexiam como antes, e eu já não conseguia dormir de barriga para cima, fiquei ali parado de pé, sobre quatro patas rústicas e verdes. As orelhas se avermelharam, e eu corri até o espelho. Era um camaleão.
Dali em diante, durante todas as noites a transformação se repetiria. E eu me acostumaria. Como estou agora. Contudo, algumas coisas me fizeram sofrer, com as transformações indesejadas, quase fui internado em um hospício ao procurar um médico, e um padre me fez ler um ritual de exorcismo. Não podia mais ir a festas, nem a bailes. Dançar a noite toda era impossível com uma causa do tamanho do meu corpo. Não podia sair à rua. Pois seria tomado pelas autoridades competentes, e no outro dia preso por seqüestrar um animal raro e me colocar no lugar dele.
A vida havia mudado para mim.
Queria pensar um lado bom para essas mudanças. Queria entender porque essas mudanças me permitiram, enxergar mais e falar menos, mesmo que houvesse uma língua grande, que eu evitava colocar para fora da boca, pois grudava em tudo. Aprendi a ouvir mais.
Ouvi mais música. Li dois livros ao mesmo tempo. Mudei de cor. Do verde para o azul, para o amarelo, para o marrom, para o vermelho.
Porque eu mudei tanto? Porque eu posso ainda mudar mesmo depois de mudado? Essa metamorfose que se encaminha todas as noites, com a vinda da lua, me fez pensar, o porquê de mudanças serem boas. Porque as pessoas seguem caminhos distintos, se ainda se amam e querem ficar juntas.
Porque as belezas da arte se transformam com o tempo. Porque tudo se transforma. Porque o mundo se transforma todo o tempo. Porque as transformações são necessárias. Porque lembramos do passado que desdenhamos há muito tempo com saudade. Nós escolhemos isso.
Como camaleão, pude ficar invisível diante das cores de qualquer ambiente e penetrar em diversas vidas. Pude ouvir pensamentos ínfimos e profanos, sedentos de amor, ódio, saudade, esperança, tristeza, alegria, e uma vontade imensa de mudar, de ser invisível ao mundo, como eu, como um camaleão qualquer.

Melancolia


As paredes estão melancólicas hoje, tudo cinza, sempre foi assim, e esse ar bucólico sempre me acalmou. Contudo, nestes últimos dias tenho entrado em desespero. Não sei direito como explicar o que sinto, sempre que vejo esses meninos na rua, entro em um frenesi de sentimentos consecutivos, que se misturam ao final, primeiro sinto a atração, aquele amoroso sentimento que traz a vontade de abraçar, de sentir a pele quente sobre nós. Depois vejo sobre mim uma vontade imensa de amar, de sentir o beijo sobre minha pele. Por último a depressão, causada pela certeza de que nada disso acontecerá.
A cada dia me sinto mais só. Todos esses que olho tem amores complexos, encadeados por uma relação firme e duradoura, há anos, me apaixono todas as semanas. Cada vez que isso acontece, a depressão volta, e cada vez que passa me apaixono de novo, e o ciclo recomeça. Eu não resisto àquele sorriso que por si só alegra meu dia.
Todos temos isso, todos sentimos isso. Quando saímos às ruas, e um belo sorriso nos alegra o dia, nos apaixonamos... Nos decepcionamos. A decepção é a conseqüência primária do amor.
Não existe amor que não gere decepção. Segue essa verdade nos caminhos da vida. Por isso, nos últimos dias não tenho saído muito, tenho evitado os sorrisos. Os desastres pequenos da alma. Fico me privando a ver filmes velhos que compro a frente do apartamento, de um senhor pomposo, e a assistir o mofo da parede crescer.
Isso me faz feliz. Pelo menos tenho tentado acreditar nessa falsa verdade. Mesmo assim me inclino contrariamente à vontade da razão esperando esse amor incrédulo que existe apenas em filmes e na minha cabeça inocente.
Quanta monotonia cerca essa vida embalada ao som de tangos antigos, de boleros, de valsas. As paredes cinza me assistiram dançar com a almofada. As ações se repetem nessa escuridão dalmífica. Sem sentido.
De vez em quando sento-me diante da janela,  e do parapeito avisto as pessoas que se movem diante do transito logo abaixo. Penso em pular. Penso em amor. Penso em esperança e em oportunidade.
Continuo sozinho, esperando atitudes. Rezando aos santos pendurados na parede da vizinha, pedindo um amor de verdade. Tudo que me vem, são noites sólidas, quentes frias. Amores. Lembranças do passado, dos amores idos, matados.
É então que lembro. Devo deixar as lembranças seguirem seu caminho, e construir de novo a minha estrada. Mas quando estava saindo à rua, pela primeira vez depois de duas semanas enfurnado no apartamento. O novo porteiro do prédio olhou em meus olhos e sorriu.

Um soldado extremista


Logo que ele chegou à casa, foi recepcionado por uma placa azul e vermelha, luminosa. Árvores abrandavam a casa no meio da floresta. Assim que entrou, viu mulheres semi despidas, e uma senhora com seu charme inglês. A pele esbranquiçada pelas luzes, o batom forte. Sem pensar subiu as escadas encarando-a. Madame Ângela Bernarda.
No meio de uma explosão de emoções, homens de guerra freqüentavam a casa para se aliviar. Mas aquele homem era diferente, só foi porque havia bebido muito. Entre braços e volúpias, uma explosão de prazer. Porém viu-se numa dualidade de sua existência, como se todo o juízo e destreza tivesse saído no gozar do colo de Madame.
Ele tinha um amigo, um único, que sempre estava ao seu lado no campo de batalha. O amigo se chamava Heifield. Era fiel, bondoso, mas safado. Ia toda semana à casa de Madame, saia com mulheres, vezes namorava, vezes só usava certos dons que recebeu com a vida. Heifield era solteiro, não havia deixado mulher em casa, diferentemente dele. 
Agora estava preocupado, depois de ter sentido o prazer acolhedor da dona do bacaré, sentia-se em dúvida, seus sentimentos vagavam num ar despreocupado do espaço, suas emoções estavam como estrelas cadentes que perderam seu rumo e estão trombando uma nas outras.
Sentimentos soltos ao vento. No campo de batalha. Silêncio. Guardava as armas nas costas e no braço, pernas apoiadas no barro. Heifield do lado, apoiando-o. Não conseguia parar de pensar em sua esposa, grávida, de oito meses, prestes a parir seu filho.
Não conseguia parar de pensar na traição. Madame Ângela Bernarda, destruindo famílias a duas gerações. Esse devia ser um lema, pensava ele. Por mais que tentasse esquecer, o pensamento sempre voltava ao mesmo ponto. Fuzileiros apareceram, viram Heifield, atacaram. Atrás da bancada de sacos de pedra, estavam protegidos, e revidaram o ataque. Mais homens mortos. Por quem estou matando? 
Saíra do seu país, defendia-o da guerra, para que essa não chegasse até sua esposa, sua família, seus amigos. E estava fazendo um bom trabalho, mas pensava. Quantas famílias eu já destruí, só nesse inverno? Heifield estava calado. Depois do último ataque ficaram silenciosos. Não só para se proteger. Mas a cada tiro disparado, um passo a mais perto do inferno. 
Com o silêncio, sua mente não conseguia para de pensar em Madame Ângela Bernarda, ao mesmo tempo que não parava de pensar em sua esposa. Decidiu enfim.
Tornei-me assassino, matei homens, famílias, amores, vi corpos estremecerem na lama, vidas sem dignidade, matanças em vão, ao invés de descansar, bebi, traí a única pessoa que me perdoaria por ter me tornado um assassino.
Dormi com uma prostituta, velha, agourenta, exploradora. Era mais fácil não existir, seria mais fácil não ter nascido.
Já não há vida lá fora, todas as manhãs quando acordo vejo o cinza dos céus e da terra, barulhos amedrontáveis. Tiros, bombas, silhuetas desesperançadas.
Finalmente, é a hora. 

Caro amor,

Tenho pensado enfim, na condição do nosso amor consumado. Os frutos estão chegando, a vida faz parte da nossa alma. encontrei uma razão para existir onde não havia esperança. Lutei pelo país. Perdi meus Escrúpulos. Traí. 
Na amedrontada guerra, que parece nunca ter fim, homens se entregam à morte como quem não consegue apoiar a própria vida.
A minha razão de viver se foi. Junto com uma explosão de furiosas emoções, que me lançaram no perdido mar de escuridão que é a tristeza. 
Um outro tempo que jaz a melancolia que só aqui existe.
Entre as tristezas e as lamentações, te entrego meu amor, através dessa carta, que abençôo com meus lábios poluídos. Um beijo.
Espero que consiga sentir o cheiro desse lugar. Para que se de tristeza chorar, sua lágrima possa me retirar a culpa e libertar minha alma. Pois só assim serei livre.
Me liberte.
Adeus

Com amor, seu ex futuro pai.

Dobrou a carta, guardou-a, no outro dia, entregou no correio militar. Deu um abraço tão forte em Heifield que o fez sentir medo. Guardou o amor, dentro de si e nas estrelas escondidas pelas nuvens de poeira. Abrandou o coração. 
Naquele dia foram atacados. 
Antes que uma bomba chegasse a atingir os militares e Heifield, saltou no meio do campo de batalha. Tiros. Gritos. Respirações curtas. Um filme. O sol. um túnel com anjos. Tudo ficou escuro.
Heifield chorou. Sentou-se, largou a arma, e não conseguia mais pensar.
Dois meses depois, recebeu a carta de seu amigo, já em casa, duas semanas após o fim da guerra, a carta retornou, e como ele já se fora, entregaram-na a Heifield que conseguiu ler entre alguns borrões de mãos molhadas.
Destinatário (a) falecido (a).

Viagens em Freud


Nem todos os sonhos do mundo são realizáveis. Naquele dia Guilherme deixou seus afazeres cotidianos para dormir, já cansado dos extremos violentos de suas atividades pediu para si mesmo um bom descanso. No dia, lutava. As memórias de suas habilidades estavam presentes nos socos e chutes esporádicos e instantâneos, em frequência ao dia de combates, vinha a noite, dotada de reflexão, apaixonante em seus beijos, abraços e carícias com o primeiro último amor. A euforia do dia era transportada para um lugar quase extinto, ou no mínimo deixava se encobertar. Vários sonhos de amores vãos embalavam a mente dele enquanto se enamorava com a amante. De dia a brutalidade, mesmo que sem violência. De noite a calmaria do abraço. 
Quando se deitou, demorou a fechar os olhos, e se deparou com um mundo novo. Um mundo colorido, cavalos azuis, pássaros verdes, amarelos, rosas, vermelhos. A grama parecia mudar de cor a cada olhada, pensei estar na fantástica fábrica de chocolate, mas a grama não tinha um gosto exatamente doce. Embora os unicórnios dali gostassem dela, andavam em bandos, ao lado dos carneiros e bodes livres. Não estava em nenhuma fazenda, nem em algum outro mundo, tudo era igual demais para isso. Não haviam cercas, Tudo estava em paz. Não vi nenhum humano, era só eu e os unicórnios brancos de chifres brilhantes. Caminhando na paz de um sol agradável, a mente se solta deixando-me voar na atmosfera mágica, e passando de terras em terras ia conseguindo ver a extensão desse mundo novo. Vi uma macieira e voltei ao chão, precisava me alimentar. Ao descer recolhi a maça mais vermelha do topo da árvore a li fiquei a comê-la. O que estava acontecendo? Queria entender. Um dos pássaros que ali estavam, na árvore, parecia querer falar comigo. Era todo azul e tinha algumas plumas manchadas de vermelho. Se parecia muito com a figura da fênix que conhecemos, aliás, lá também existiam algumas dessas aves maravilhosas. Era a extensão de um mundo que não poderia existir onde vivo. Ouvindo o pássaro conseguia me aproximar daquela extensão, e me sentia parte daquilo. Ali voei. Senti, vivi. Quando o pássaro voou em meu ombro, senti um abraço completo. Era como se o mundo ali tivesse parado. Os barulhos pararam. As aves pararam, e o mundo se desfez. Abri os olhos. Sonho estranho! Passei alguns dias me sentindo mal por isso. Queria saber por que aquele sonho havia acontecido, nunca desejei ver nada daquilo. Tenho um professor de literatura que se apaixonaria por um mundo assim. Sentei-me na cama, eram duas horas ainda, eu tinha pela frente mais da metade da noite. Mas não me sentia mais cansado, aquele sonho pareceu lavar minhalma, e retirar de meu corpo o cansaço. O que aquele pásssaro simbolizava? Foi o abraço mais aconchegante que já senti. Talvez não pertencesse àquele mundo. Talvez fosse uma extensão dos meus sentimentos. A forma como ele surgiu foi interessante. De uma explosão que veio do nada. Eu conheço uma pessoa que explode a todo o momento, e me causa um grande desconforto. Mas não me abraça após isso. Pelo contrário. A explosão é o sinal do maior afastamento. Não posso dizer aqui quem é. Mas eu acho que entendi meu sonho. Devo criar meu próprio mundo. Sem os medos do passado, e com as perspectivas do futuro. Pois é ali que a liberdade se fará verdadeira.

As divagações de Oliver


Aquele menino sempre fora estranho, se recolhia no meio dos outros, se encolhia quando via muitas pessoas, falar em público era um problema, na verdade, o simples ato de falar era um milagre, não chorava, não sorria, não era possível vê-lo triste, Oliver não expressava nada. Seu rosto era apagado como o de um fantasma. 
Era um problema conhecer seus pensamentos, pois não tinha amigos, não conversava com ninguém, desde pequeno os professores achavam o comportamento doentio. Oliver ia frequentemente a médicos, psiquiatras, psicólogos, mas todos diziam a mesma coisa, o menino está normal. Não há com ele nenhum problema. Os sinais vitais estão bons, as taxas sanguíneas também, a mente funcionava perfeitamente.
Oliver não falava com a mãe, nem na hora de pedir comida.
Oliver apenas apontava. Quando via um copo com água e estava com sede, erguia o braço fino e esticava o dedo em direção ao objeto.
A mãe rezava, não ficava brava com o menino, pois ele nada fazia, ela pensava que ele na verdade nunca aprendera a falar, por algum golpe divino, algum pecado que ela cometeu e que Deus nunca a perdoara, por isso o filho nasceu assim, meio tonto.
Oliver sequer se sustentava em meio as pessoas, não fazia esforço nenhum, gostava de ficar sozinho. O que acontecia com o menino?
É difícil pensar como uma mãe pode achar o filho meio tonto, até porque não é coisa que se pense, não existe meio tonto, ou é tonto inteiro, ou não é.
Havia uma explicação para aquilo tudo. Durante a noite, Oliver se levantava e falava sozinho, até cansar, sobre tudo o que acontecia com ele durante o dia. O menino não sabia se expressar na frente dos adultos, mas usava as palavras com uma sabedoria imensa. Já diz o ditado, não tem nada há falar de bom, cale a boca. Não sei se isso é ditado de gente. Todavia já o ouvi de muitas bocas.
Conversava com seu amigo imaginário, contava tudo a ele. Seu nome era Miguel. Era um menino loiro, tinha entre 16 e 17 anos. Oliver não sabia ao certo. Tinha olhos azuis e uma feição amena, parecia bondoso, e era. Na sua mente existiam apenas imagens de flores e paisagens, algumas histórias de um mundo distante, Miguel se sentava numa cadeira de balanço velha, comida pelas traças numa das pernas, e com um dos apoios de braço torto.
A cadeira rangia. Oliver pensava em coisas como o sol nascendo, a lua se pondo, as flores se abrindo, e seu coração pulsando, queria saber como o mundo funcionava. Porque as pessoas conversavam tanto? Não tinha nada a dizer. Apenas observava. Por isso era calado, não conversava com a mãe, porque em certo momento da vida tinha medo de que ela ficasse brava com ele, por nunca ter falado antes, e isso só se prolongava.
Esse não era o único motivo para falar, ele tinha medo da mãe, se assustava quando ela estava a bordar com as amigas nas quintas feiras a tarde, servia o chá, calado. E a mãe, segurando um cigarro esbravejava a fumaça por todos os cantos da sala. Fofocava. Falava da vizinha, da tia, da sogra, da irmã e quiçá da mãe em alguns momentos.
Miguel conversava com Oliver sobre coisas que a ele interessavam. As histórias do Capitão América que lia todos os dias nos quadrinhos velhos da biblioteca da casa do senhor Manoel, da esquina. Ele tinha tantos livros. Oliver ficava perdido. Interiorizava-se nos pensamentos e viajava, conheceu dentro daquela sala o centro da terra, os dinossauros, as flores, os vampiros e lobisomens, mas o que mais encantava o menino era sem dúvida aquela figura com um escudo de estrela.
Miguel sabia de todas as histórias, e por isso Oliver gostava de conversar com ele.
Oliver e Miguel eram mais que amigos, havia entre eles uma relação estreita, era como se um fio de seda saísse do coração de um e se prendesse ao outro.
Não havia romance entre os dois, só uma bela amizade. Oliver tinha os olhos pretos como jabuticabas maduras e brilhavam no escuro como os olhos de um felino. As mãos delicadas e perfeitas, o corpo magro, a pele branca, e os cabelos negros. Na cabeça, pensamentos que flutuavam num mar de perdições imaginárias. Ora passavam pelos olhos de Oliver como trens, ora apareciam como flashes de sua criatividade aparente.
Que Oliver não falava era fato. Mas no seu quarto, haviam esculturas de barro e pinturas que deixariam qualquer adulto formado em arte impressionado.
A mãe reconhecia o talento do filho, e tentava a qualquer custo vender as obras dele na venda do tio, numa esquina de um bairro pobre da cidade, prometendo a ele parte do dinheiro. Oliver nunca concordou.
As pinturas retratavam o rosto e o corpo de Miguel. A mãe conhecia a solidão do filho, então pensava naquilo como pura imaginação infantil. Como Oliver nunca tinha dito nada, para a mãe ele ainda era uma criança inocente. 
Quando pintava, as imagens se criavam nas tintas, nos pincéis e nas telas que sempre ganhava de presente da mãe.
Miguel era cada vez mais real, as pinturas davam vida a aquela figura imaginária.
Um dia, Oliver brigou na escola. Chegou com raiva em casa. Ignorou Miguel e sua voz doce. Cobriu-se e tentou dormir. Conseguiu em certo momento. Depois que Miguel desligou a matraca.
No sonho, ele estava andando em um campo verde, parecia um pasto que tinha visto outro dia no passeio com o tio, só que desta vez sentiu o cheiro doce e verde da grama. Conseguiu tatear algumas margaridas que brotavam em meio ao capim, viu os cavalos correrem, e Miguel aparecer. 
Correu em direção ao menino, como se fosse seu irmão mais velho, tentava abraçá-lo.
Miguel sorria calmamente para Oliver. O aceitou com seus braços, e seu queixo pousou em cima da cabeça de Oliver.
Os dois ficaram ali por alguns minutos.
...
- Oliver! Oliver! Acorde! Tem que ir o dentista hoje!
Oliver odiava o dentista, ficava tentando fazê-lo falar a qualquer custo. Foi. Voltou. Ficou em casa, na cama, ouvindo música, estirado, parecia esperar que alguém batesse a porta. Na verdade, não conseguia parar de pensar no sonho. Sentia-se tão bem, olhava para a cadeira de balanço feita pelo avô, já falecido. E pensava em Miguel.
Não sabia se ia esquecer o sonho tão cedo. Os pensamentos corriam como nunca, pintou um abraço, escondeu-o no meio do caderno para que a mãe não visse.
Olhou para o teto do quarto, sua mente viajou pelo infinito, ouvia o ranger da cadeira de balanço, viu uma flor rosa voar para dentro do quarto com o vento. Era uma flor de macieira, havia uma no quintal, e como o quarto de Oliver ficava na parte superior da casa, era fácil ver o vento empurrar folhas para dentro do quarto. Oliver não se incomodava. Gostava de sentir o cheiro das flores aromatizando seu leito noturno. No agradável calor da tarde Oliver imaginava o abraço.
Dormiu. Acordou.
Foi à loja de música no outro dia, estava fechada. Foi, então, para a biblioteca do senhor Manoel, era domingo e não tinha absolutamente nada para fazer, não havia mais conversado com Miguel. Ele não aparecia há dias.
Tentava passar o tempo, mas o hábito de conversar com Miguel a noite só estava piorando as coisas, agora, além de não dormir, estava sozinho.
Caminhando para a escola no outro dia, viu Miguel descendo do ônibus, começou a pensar em milhões de possibilidades para sua visão. Miguel era real todo esse tempo? Será que estava com tanta saudade daquele amigo distante que o estava vendo em outros lugares.
As perguntas foram respondidas pela professora de português na sala. Um aluno novo, chamado Gabriel havia entrado na turma.
Oliver estava preocupado, os cochichos voavam para cima do menino bonito, sobre sua esquisitice. Queria se aproximar do menino, mas como sem falar? Olhava diretamente para Gabriel, sonhava com um abraço carinhoso. Era isso, Miguel saiu dos sonhos para entrar de vez na vida de Oliver.
Oliver ainda estava tentando ser sensato.
Observava, mas não conseguia distinguir nenhuma diferença aparente, o coração latejava, as pupilas se abriram de tal forma que a luz que atravessava a janela quase impediam o menino de copiar a matéria escrita no quadro.
Gabriel era Miguel, ou Miguel era Gabriel, que confusão!
Oliver nada disse naquele dia, as expressões noturnas sumiram também.
Oliver rezou, pela primeira vez.
No outro dia, novamente, tentava ser normal, mas não conseguia, na aula de educação física, Gabriel não quis jogar futebol com os outros meninos. Oliver treinava seu xadrez sozinho, como sempre. Gabriel se aproximou, parou na frente de Oliver.
Levantou o braço com os pelos aloirados e movimentou os dedos compridos em direção ao primeiro peão do lado adversário de Oliver.
Sentou-se
Curvou a coluna e apoiou o queixo nas mãos.
Oliver disse pela primeira vez.
-Quer jogar?
A professora assustada ligou imediatamente para a mãe. 
O jogo seguiu, Gabriel movimentava as peças com cuidado, Oliver tremia, o jogo começou a ficar emocionante, a professora parou ao lado, meio distante, tentando observar tudo, para ver se conseguia ouvir mais alguma palavra.
Gabriel levantou a mão em direção a rainha e apontou o caminho para o rei de Oliver.
- Xeque!
Oliver mudou um peão de lugar e livrou-se da jogada, todavia o cavalo de Gabriel estava posicionado.
- Xeque!
Oliver não via mais saída, moveu a rainha, e a perdeu, Gabriel moveu um peão, Oliver comeu o cavalo com o rei. Livrou-se do xeque aparente. Gabriel moveu um bispo, deixando Oliver a um peão da perda. Oliver moveu o cavalo. Gabriel moveu outro bispo deixando Oliver em xeque novamente. Oliver, estava sem saída, não havia mais o que fazer, bastava se render. Moveu um peão.
- Xeque mate.
Oliver sorriu, e Gabriel também. A professora estava atenta. Os dois se abraçaram. Gabriel era bem mais alto que Oliver, pousou queixo na cabeça do menino.
- Não se preocupe, estou aqui.
Oliver deixou cair uma lágrima, anos de solidão haviam acabado.
Miguel existia, ficaram amigos, conversaram, Oliver falava em casa agora, quando a mãe perguntava, porque nunca tinha falado nada antes, Oliver respondia que não conseguia.
Um dia saíram juntos, três anos depois, Gabriel tinha 20 anos, Oliver 18.
E naquele dia, as margaridas do campo dos sonhos de Oliver foram vistas de novo.
O que Gabriel tinha na cabeça? Ainda hoje é uma dúvida. Os dois ficaram amigos. Gabriel e Oliver passaram muito tempo juntos, todos os dias, entraram juntos na faculdade, no mesmo curso, se formaram, são professores na mesma escola, que é deles. Moram juntos. São amigos. Apaixonados um pelo outro, a cada dia a paixão é renovada, Oliver nunca mais se calou, mas não abria a boca fácil, ele era quieto por natureza. Quando olhava Gabriel, as palavras se transportavam pelo ar, através de seus olhos negros brilhantes.
Oliver se casou, têm dois filhos, um deles não fala.
Gabriel se casou, têm duas filhas, uma delas nunca disse uma palavra.